sábado, março 6

Eram dias de autismo opcional. Eu não sabia ser agradável, ou qualquer coisa que o valha. Simplesmente pelo óbvio motivo de não querer o ser. Minha voz era uma coisinha triste e mau humorada. Eu dormia sem saber o porquê de estar tão cansada. Pesadelos. Alguns bem crueis, outros um pouco menos. Ao passo de duas ou três semanas, a doença fugia do meu coração. Eu sofria tão menos, ao afundar no travesseiro minha cabeça latejante de dor. As pílulas cumpriam seu dever de me manterem estável. Eu dormia profundamente. E pela manhã, bem-te-vis cantarolavam despreocupados próximos à minha janela. Eu inspirava num longo puxar de oxigênio, o ar vital, que inundava meus pulmões, dando-me o sopro de vida de cada dia. Deus se tornava muito mais real e eu o amava. Eu estava feliz por ter acordado e superado aquela fase ruim. Conseguiria fazer do meu dia um tempo produtivo e tranquilo. Eu sorriria e seria conivente com as pequenas alegrias diárias, sem tentar sabotá-las como de costume. Até que o sol se apagasse novamente. Sem despedidas, sem desculpas. Ele apenas se punha, calado e perverso. E eu ficava com a sensação de que estava sendo vítima de mais uma pegadinha de humor negro e sádico. O caos estaria de volta. E eu sou a vítima perfeita.

Um comentário:

Anônimo disse...

Está escrevendo cada vez melhor. Parabéns!

Que fonte você usa na letra dos textos, Jessy?